Bom dia! Aqui é a Luiza Caires e hoje falamos de uma Amazônia antiga urbana, distante do senso comum e do que os próprios pesquisadores já acreditaram. A floresta e sua biodiversidade também são saúde através dos compostos naturais. Ainda: o paradoxo do exercício físico no trabalho. E os paleontólogos que nunca saíram da quinta série. Convidamos a oceanógrafa Adriana Lippi para contribuir nesta edição. Este é o Polígono de hoje, 31/05/22.

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NOTAS RÁPIDAS

Amazônia urbana
O passado da Amazônia boliviana é mais urbano do que se acreditava. Um estudo utilizou sensores laser (Lidar) embarcados em helicóptero para mapear a região, indicando que, entre os anos 500 e 1400, ela dispunha de pirâmides, estradas, canais e muralhas. Bernardo Esteves, que relatou a descoberta para a revista piauí, resumiu: “Tinha cara de cidade, jeito de cidade, estrutura de cidade”. Mas os autores preferiram adotar um tom mais prudente, chamando a configuração de “urbanismo de baixa densidade”.

Sociedades avançadas
Quem vivia na região no período era o povo Casarabe. Cada vez mais pesquisas demonstram que a Amazônia era habitada por sociedades avançadas bem antes dos europeus. Nesse texto (em inglês), o arqueólogo Christopher Fisher situa melhor a descoberta dentro do debate e prevê que a continuidade do trabalho vai exigir parcerias com comunidades indígenas e outras partes interessadas.

Da floresta ao laboratório 
Acidentes com serpentes são considerados uma doença tropical negligenciada, por atingir populações vulneráveis e porque há pouco incentivo à pesquisa de melhores tratamentos. Um trabalho liderado pela pesquisadora em biodiversidade e biotecnologia Aline Adrião apresenta compostos de plantas de todo o mundo usados ​​como inibidores de veneno. Ela explica que, para muitas populações, “a única opção de tratamento disponível ainda é o uso de plantas, extratos e chás de folhas e raízes”. Assim, plantas e seus produtos naturais têm sido cada vez mais estudados. Mais um motivo, entre milhares, para deixar as florestas de pé.

Nem todo exercício
Quando o assunto é atividade física e qualidade de vida, qualquer exercício conta? Nem sempre. Desde a década de 1950 os pesquisadores começaram a sugerir que a atividade física ocupacional poderia não melhorar a saúde: é o chamado paradoxo da atividade física, como conta Daisy Motta. Já há estudos específicos sobre saúde cardiovascular mostrando que o esforço no trabalho não equivale à atividade física planejada.

Pedaladas precárias
Exemplo deste paradoxo são os vários quilômetros pedalados pelos entregadores de aplicativos. Uma pesquisa que os acompanhou em SP mostrou como é enganosa a imagem de vida ativa e sustentabilidade associada por alguns a este trabalho. Condições precárias, sobrecarga, riscos de lesões e de acidentes, e exposição à poluição também entram no saldo. E claro, o estresse: o estudo destacou que a gamificação do trabalho, com pontos por performance, estimula a competitividade e o esforço pela recompensa financeira, ainda que isso resulte em riscos.

Viver em sociedade
Uma lição de perdão e reconciliação após o conflito vinda dos chimpanzés, nesta sequência da Mellanie Dutra. Mellanie mostra também a empatia dos ratinhos que soltam os companheiros presos. As manifestações mudam de complexidade em cada espécie, mas o que os pesquisadores têm visto é que o comportamento de animais humanos e não humanos parecem compartilhar as mesmas bases.

Macacos se mordam
A ideia apresentada acima vale para o comportamento como um todo, não só para as atitudes que consideramos “fofas”, que os especialistas chamam de “prossociais’’. No livro Homo ferox, que busca entender as origens da violência humana, temos exemplos de primatas com comportamentos extremamente agressivos, como as lêmures que praticam infanticídio contra as crias de outras – e depois são”linchadas" pelo bando; os chimpanzés que dizimam na porrada filhotes e adultos; e líderes destituídos a base de dentadas.

Influentes
A lista da Times trouxe vários cientistas em 2022. Entre eles, o brasileiro Tulio de Oliveira, que sequenciou com sua equipe na África do Sul a variante ômicron e alertou o mundo. Também, Gregory Robinson, do telescópio James Webb, os cientistas do clima Panmao Zhai e Valérie Masson-Delmotte, do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), e Timnit Gebru, a cientista de computação especialista em ética em Inteligência Artificial. Em 2020, Gebru foi demitida do Google após acusar a corporação de “silenciar vozes marginalizadas”, e mais tarde fundou o próprio instituto.

 

VOCÊ VIU?

  • O mesmo Tulio de Oliveira que ficou entre os 100 mais influentes reforça a indignação dos pesquisadores aqui no Brasil com mais um corte na ciência nacional. Um bilhão de reais vai sair do orçamento de universidades e institutos federais.
  • Ficou encasquetado com os 95٪ de heterossexuais no Brasil da pesquisa do IBGE, que depois disse que não é bem assim? O Paulo Lotufo explica que a pesquisa “não foi delineada para verificar a frequência de orientação sexual”, e por isso há vieses. “Ruim publicar e depois assumir a inexatidão”. Outros aspectos da pesquisa também foram criticados.
  • Praticamente nenhuma fruta que compramos na feira ou no mercado existia originalmente na natureza. Pelo menos não da forma que conhecemos. O fio do Dennis Almeida mostra a versão selvagem de vegetais que domesticamos.
  • Este vídeo explica de maneira super didática como a redução na população de beija-flores pode implicar na extinção de outras espécies. A revista Pesquisa Fapesp também traz reportagem em texto e podcast.
  • Alberto Pilati traz uma lista de bichos extintos com nomes científicos curiosos. Tem para todos os gostos: Poposaurus, Pintosaurus, Dinheirosaurus, Bambiraptor, Petrobrasaurus e até um Chupacabrachelys. Vai lá ver o fio todo no Twitter que vale a pena.

NOTA DO CONVIDADO

Um oceano de razões para cuidar
Adriana Lippi é oceanógrafa, mestranda na Unifesp, conselheira da Liga das Mulheres pelo Oceano e colaboradora do projeto “O que você faria se soubesse o que sei”.

O Oceano que cobre 71% da superfície do nosso planeta fornece pelo menos metade do oxigênio atmosférico, absorveu cerca de 90% do calor causado pelo aquecimento global nos últimos 50 anos, transporta cerca de 80% das nossas mercadorias, e só graças aos cabos submarinos temos a internet nos conectando globalmente. Nós, mesmo sendo seres terrestres (que podem adorar uma praia), temos 40% da nossa população vivendo até 100 km da linha de costa. São inúmeras as formas como dependemos e nos relacionamos com esse Oceano, no singular, já que as bacias oceânicas estão todas conectadas como mostra a projeção de Spilhaus. Apesar disso (e muito mais), conhecemos pouco do Oceano. Temos menos de 20% do fundo marinho mapeado com detalhes, enquanto há mapas com resolução de cm da Lua e de m de Marte. A iniciativa da Década do Oceano (2021-2030) pode ajudar a melhorar o cenário, são 10 anos para melhorar a colaboração entre cientistas, levar a ciência oceânica para as políticas públicas e buscar usos menos predatórios do oceano. O começo de todo esse processo vai ser por mais pessoas reconhecendo o papel essencial que o Oceano tem na vida, nossa e de todos os seres terrestres.

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Essa newsletter tem curadoria de Luiza Caires, desenvolvimento de Renata Hirota, design de Rodolfo Almeida, edição de Alexandre Orrico, Samira Menezes e Sérgio Spagnuolo e apoio do Instituto Serrapilheira. Saiba mais.

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